O Secretário de Estado do Mar José Maria Costa foi Presidente da Câmara Municipal de Viana Castelo entre 2009 e 2021; Presidente da Comunidade Intermunicipal do Alto Minho – CIM entre 2013 e 2021; Membro do Comité das Regiões e Membro do Conselho de Concertação Territorial entre 2014 e 2021. Além disso, foi Presidente do Conselho de Administração do Grupo de Ação Local Costeira Litoral Norte entre 2013 e 2017; Presidente do Conselho de Administração da Fundação Gil Eannes entre 2010 e 2021; Presidente do Conselho Executivo da Conferência das Cidades Atlânticas – Atlantic Cities entre 2017 e 2021; Presidente da Direção da Associação Eixo Atlântico entre 2012 e 2014 e Presidente da Assembleia Geral das Águas do Norte entre 2018 e 2020.

O Fórum Oceano alerta sobre o papel do mar na vida e no futuro de todos. Qual a importância de estar inserido na programação da Temporada Portugal-França?

O ano de 2022 tem sido marcado por um intenso debate, à escala global, sobre a saúde do oceano e a importância do mesmo num contexto de alterações climáticas, entre os quais se destacam o One Ocean Summit, realizado em França, em fevereiro deste ano, e a II Conferência das Nações Unidas sobre os Oceanos, realizada em Lisboa e co-organizada por Portugal e Quénia.

Portugal e França, ao colocarem o tema do oceano na programação da Temporada Cruzada, reforçam o compromisso com a preservação do oceano, e o evento Fórum Oceano sublinha a importância da ciência e do conhecimento científico nos processos de suporte de tomada das melhores decisões.

É de destacar ainda o facto de Portugal e França serem os precursores e herdeiros do humanismo europeu, partilhando uma visão comum dos grandes desafios da Europa, e revendo-se na urgência de construir uma Europa mais forte, mais unida, mais justa e melhor preparada para responder às legítimas expectativas dos cidadãos, inclusive no domínio do oceano.

Portugal e França partilham o facto de serem Estados-Membros e atores da Política Marítima Integrada da União Europeia, cientes de que a coordenação das políticas para o oceano, os mares e o litoral pode colher mais benefícios e minimizar a interferência ambiental.

É de destacar, ainda, o facto de os dois países serem Partes da Convenção para a Proteção do Ambiente Marinho do Atlântico Nordeste, também conhecida como OSPAR.

Assim, Portugal e França observam o Atlântico como um bem comum, um território extenso, com grande riqueza e que urge proteger, para benefício da atual e das futuras gerações. Por esta razão é reconhecido por todos o facto de a Temporada Cruzada abordar este património comum, primeiro em Paris, em março deste ano e depois em setembro, em Lisboa. 

O futuro passa pela união e pela cooperação científica e diplomática entre países, como acontece neste fórum, com instituições portuguesas (MARE – Centro de Ciências do Mar e do Ambiente) e francesas (Institut de l’Océan de l’Alliance Sorbonne Université), num assunto tão delicado como o oceano? 

O presente passa pela conjugação de esforços, não só da academia, mas também das empresas, dos cidadãos, das autoridades nacionais, regionais e locais. A Estratégia Nacional para o Mar 2021-2030 reconhece que a produção de conhecimento para suporte às políticas públicas deve ser uma prioridade e carece de abordagens multidisciplinares e colaborativas. Assim, as universidades, os centros de investigação e os laboratórios do Estado são, por natureza, os espaços de excelência para a investigação e promoção do conhecimento científico, e a sua ligação à sociedade deve ser ainda mais estimulada. O mesmo se aplica ao desenvolvimento e transferência de conhecimento científico para as empresas, sendo de referir neste contexto o papel dos Laboratórios Colaborativos (CoLabs) na implementação de agendas de I&DI orientadas para a criação de valor económico e de emprego qualificado. A participação dos cidadãos no desenvolvimento das ciências do oceano é importante, devendo ser dada atenção particular à ecologia, ao património cultural e às tradições ligadas ao mar, fortalecendo a herança marítima do país e a importância das atuais e futuras profissões do mar.

A ENM 2021-2030 reconhece que a capacitação de cientistas e a formação de técnicos especialistas nas mais diversas disciplinas, pode ser promovida através da criação de ambientes dinâmicos e com forte potencial de interação e de inovação. Neste âmbito, deve assegurar-se a complementaridade de perfis, a participação do setor privado, da academia e dos atores públicos, e a concretização de iniciativas capazes de desenvolver ideias através da experimentação e da construção de protótipos. De igual modo, a qualidade da ciência portuguesa deve ser potenciada no contexto internacional através da colaboração ativa com organismos internacionais. Por outro lado, é também premente integrar o conhecimento científico conduzido por entidades terceiras no espaço marítimo nacional, através da participação de cientistas portugueses a bordo de cruzeiros científicos estrangeiros, e de outros meios que assegurem acesso aos seus resultados de investigação.

Perante esta visão é de saudar a cooperação entres instituições como o Mare – Centro de Ciências do Mar e do Ambiente e o L´Institut de L´Ocean de L´Alliance Sorbonne Universitè que é um exemplo que deve ser replicado sendo desejável que no final da ENM em 2030 seja um exemplo prosseguido por outros centros, entidades e laboratórios.

De que forma considera que iniciativas como esta contribuem para um estreitamento da relação entre o Estado, as instituições e a população? Qual o papel das mesmas na transmissão da mensagem para a preservação dos oceanos?

O Fórum Oceano com a 1ª. sessão em Paris e a 2.ª em Lisboa, com diferentes temas, com um painel de oradores com grande experiência e com público muito interessado, é a prova de que há espaço para o debate das matérias relacionadas com o oceano. Neste espaço de debate de ideias, cabem todos os interessados e todas as visões.  

Precisamos de todos, para mobilizar a sociedade para a causa do oceano, porque o futuro dos seres humanos e do oceano está interligado. É urgente pensar e executar uma agenda global para o oceano, focada em soluções práticas, baseadas na ciência e para lidar com os maiores desafios do Planeta. A mensagem é simples: nenhum país conseguirá resolver sozinho os desafios que o Planeta enfrenta e são necessários passos decisivos para a implementação de medidas concretas no âmbito da Agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável.

Defende que uma visão unificada permite provocar e ampliar a capacidade de atuação de outras áreas, na conservação, defesa e gestão do oceano?

Uma visão articulada entre todos os atores é desejável e recomendável porque nenhum país conseguirá resolver sozinho os desafios que hoje enfrentamos, como referi anteriormente. A Política Marítima Integrada é um exemplo de articulação em que as questões relativas aos oceanos e mares estão interligadas e que, para obtermos resultados, devem ser aproveitadas todas as sinergias entre as diferentes áreas, sendo imprescindível que exista articulação em todas as políticas ligadas ao mar. Ao observar a PMI da União Europeia, esta é composta por um conjunto de políticas transversais que interagem e se complementam: crescimento azul, estratégia de segurança marítima, conhecimento do meio marinho, ordenamento do espaço marítimo, vigilância marítima integrada e estratégias para as bacias marítimas integradas. São temas transversais e complementares, que implicam uma articulação entre Estados-Membros e a UE.

Enquanto Secretário de Estado do Mar e membro do Governo Português, e estando Portugal tão próximo do mar, que medidas pretende aplicar no imediato para a preservação do Atlântico?

Portugal tem jurisdição sobre cerca de metade do espaço marítimo que resulta da soma das áreas dos espaços marítimos dos Estados-Membros da União Europeia, e sobre uma vasta área de solo e subsolo marinhos no Atlântico Nordeste. Este facto constitui-se como razão da responsabilidade acrescida que Portugal deve assumir nas questões ligadas à governação do oceano, incluindo a sua conservação, conhecimento e defesa.

Na recente conferência dos Oceanos, o Sr. Primeiro-Ministro anunciou os compromissos do país:

– Aproveitando a centralidade atlântica dos Açores, o Governo português «dará continuidade ao investimento na iniciativa Air Center, enquanto rede de colaboração científica entre países e institutos de investigação sobre áreas como o espaço, a observação da atmosfera, os oceanos, o clima e a energia». 

 – Criação do gabinete da Década das Nações Unidas das Ciências do Oceano para o Desenvolvimento Sustentável»,

Tendo em conta que Portugal dispõe da maior biodiversidade marinha da Europa, «assegurar que 100% do espaço marítimo sob soberania ou jurisdição portuguesa seja avaliado em Bom Estado Ambiental e, até 2030, classificar 30% das áreas marinhas nacionais». Aliás, este ano Portugal «deu um passo nesse sentido ao aumentar 27 vezes o tamanho da Reserva Natural das Ilhas Selvagens, tornando-a na maior área marinha protegida do Atlântico Norte». 

Ao nível da segurança alimentar, transformar a pesca nacional num dos setores mais sustentáveis e de baixo impacto a nível mundial, mantendo 100% dos stocks dentro dos limites biológicos sustentáveis».

Outro compromisso diz respeito ao nexo Clima-Oceano, «que exige a sua proteção como o principal regulador climático e sumidouro de carbono, mas que proporciona também recursos essenciais da nossa estratégia de descarbonização e de autonomia energética», pelo que o país vai apostar na produção de energias renováveis oceânicas com vista a atingir 10 gigawatts de capacidade até 2030, e criar, em parceria com a Agência Europeia de Segurança Marítima, uma zona piloto de emissões controladas no mar português».

«A economia azul é um elemento central da estratégia de desenvolvimento» é o tema do quarto compromisso assumido por Portugal, procurando promover o empreendedorismo, o emprego e a inovação, em particular na bioeconomia azul. Com este objetivo vamos operacionalizar o campus do mar, incluindo a criação de um Hub Azul, para duplicar o número de startups na economia azul, bem como o número de projetos apoiados por fundos públicos».